Boa Sorte

Direção: Carolina Jabor

 

Elenco: Débora Secco, João Pedro Zappa, Pablo Sanábio, Cássia Kiss Magro, Felipe Camargo, Mariana Lima, Enrique Dias e Fernanda Montenegro

 

 Toda vez que um filme se propõe a sair do lugar comum e o faz de maneira no mínimo correta, devemos elogiar, principalmente tratando-se de um longa nacional.Boa Sorte é um deste exemplo, contando com a boa atuação de Débora Secco, uma dose de fábula com um toque de “A culpa é das estrelas” e uma direção correta,torna-se uma singela história de um relacionamento fadado ao fracasso pelas graves condições dos envolvidos.

 Baseado no conto do Jorge Furtado (Frontal com Fanta), Boa sorte é econômico e direto ao mostrar João (Zappa) um adolescente com graves transtornos sociais e esquizofrenia sendo atendido pela Dra. Lorena (Kiss Magro) em uma clinica de reabilitação. Durante um destes dias de consultas e passeios solitários, surge à figura de Judite (Secco), uma mulher que pagou um preço alto pelo passado de exageros: viciada em remédios controlados,soropositiva e com pouco tempo de vida.

 Roteirizado pelo próprio Jorge Furtado, o relacionamento do casal não apresenta nada de novo para o gênero, deixando o cenário e as condições físicas e psicológicas de ambos darem o tom da história.Uma característica da narrativa apresentando pela diretora Carolina Jabor é o uso da câmera por várias vezes fazendo o espectador assumir a posição de João, principalmente quando envolvendo os pais do garoto, vividos por Felipe Camargo e Mariana Lima – como tivéssemos julgando-os por seus comportamentos.

 Os comportamentos familiares são importantes itens na construção dos personagens principais. Por parte de João, temos uma família de direita desestruturada e indiferente à presença dele.Este tratamento como um “invisível”, torna-se o motivo João ser viciado em remédios (Frontal) para os transtornos, sendo ingeridos com Fanta laranja – dando este aspecto infantil a algo grave.

  O drama da personagem Judite é agravado ao conhecermos seu passado familiar simbolizado na figura de sua avó materna Célia (Montenegro), que a visita para levar seus itens de pintura e clandestinamente manter seu vicio. O relacionamento não é dos melhores, muito por culpa das lembranças da mãe de Judite.

  Débora Secco realmente é a figura principal e mais dimensional do longa, sendo  dona das melhores sequências, como a cena dançando pelos corredores da clínica e da piscina onde ela desnuda seu corpo submerso no seu drama e conflitos internos entre o corpo e mente(“O corpo é o problema”).Os diálogos também são mais apreciáveis quando ditos pela atriz, soando uma mulher decidida como não existisse o amanhã – quando perguntada por que ela vai morrer, ela responde de maneira irônica e sem chance para outros questionamentos (“Precisa mais?”).

  Voltando ao aspecto da direção,a narrativa é engrandecida pelo detalhe do figurino :Judite surge em quase todas as cenas com a cor vermelha predominando em seu vestuário.Simbolizando não somente a paixão que emana em João, mas a violência interna devido a sua doença – neste caso podemos usar o fato deste vermelho manchar simbolicamente seu mundo de fantasia quando seu diário é manchado por seu sangue.

  No caso da fotografia e direção de arte, conseguem dimensionar a frieza dos corredores da clínica e o desgaste dos velhos prédios representado aquele mundo destruído e sem saídas para a maioria dos seus pacientes, tornando o lugar ainda mais bucólico.

  O relacionamento entre João e Judite possui um risco sempre presente devido à doença dela e João – se achando invulnerável – não se importa correr os riscos.O amor por Judite é a força que ele precisa para seguir em frente, mas sendo este um caminho suicida, nada mais correto em “mata-lo” em sua raiz.

  O tom de fábula é assumido em uma bonita seqüência mostrada em animação que revela o sentimento por trás dos fatos, na visão de Judite – e a maneira com é feita esta revelação,usando pistas deixadas anteriormente,soa convincente e natural.

  A montagem na parte final do filme pode soar um pouco forçada devido às idas e vindas (assim como os diálogos), mas necessária para enfatizar o estado de espírito atual de João (detalhe para o figurino dele no diálogo com Célia) e as motivações deles para sua sorte atual. Interessante detalhe que nesta passagem a diretora usa várias cenas com uma câmera Plongee (do alto para baixo) simbolizando obviamente o ponto de vista da protagonista e ratificando o sentimento de proteção com João para o público.

   Simples,sem complicações, Boa sorte é um filme agradável na medida do possível,sem grandes novidades ou aprofundamentos .Mas um bom sinal dos novos ares que o cinema nacional deve sempre respirar.

Cotação 3/5