O Lobo atrás da Porta

Direção : Fernando Coimbra 
Elenco  : Leandra Leal , Milhem Cortaz ,Fabíula Nascimento e Juliano Cazzaré
 
      

    De início, “O lobo atrás da Porta” nos transporta para a atmosfera quente na zona norte do Rio de janeiro e sem perder tempo, nos apresenta a situação que moverá a narrativa do filme daqui em diante: O rapto da filha de Bernardo (Milhem Cortaz) na porta da escola. Para em seguida já estarmos na delegacia, com toda situação armada, onde o Delegado (Juliano Cazarré, ótimo) tenta por um fim na confusão que se apresentava como um caso extraconjugal do pai da criança.

    Neste momento, o diretor não economiza na movimentação da câmera tirando mais de cada cena, como por exemplo, se aproximar lentamente da diretora da escola, ao receber a notícia do sumiço da garota e fechando bem o plano na conversa entre Bernardo e o Delegado, este último dono das melhores tiradas do filme, com seu linguajar próprio (“Café Xexelento” é impagável) e agressivo na medida certa (“Dar uma Rocha”) para obter as respostas o mais rápido possível. Interessante também o fato do Delegado ser apresentado aos poucos, no início somente a voz (e no final em Off)  transformando o público de interrogador para espectador.

     Hábil também em manter o clima tenso durante toda a projeção, o roteiro ( Do próprio diretor) e a montagem vão apresentando as motivações dos personagens aos poucos e o seu desenrolar de maneira não linear , mas sem se tornar confuso. Até esta parte do filme tratamos o caso como adultério--mesmo que tenha ocorrido um possível sequestro--para posteriormente no decorrer dos interrogatórios --que cada vez tomam proporções maiores de acordo com o envolvimento de Bernardo e Rosa-- faz com que realmente tememos os destinos dos envolvidos. E mesmo que já saibamos ou suspeitemos do desfecho (história verídica), jamais deixamos de sentir uma angústia pelo que vai acontecer. 

     A boa direção e desenvolvimento dos personagens são ratificados por Milhem Cortaz , que com seu Bernardo cria um indivíduo que pode soar extremamente comum, uma espécie de malandro, que não pensa duas vezes em trair a mulher com ajuda de um amigo e faz juras amor para a amante . Mas que toma atitudes extremas para pode manter as aparências e tentar salvar seu casamento, família e seu modo de viver. Ao lado dele encontramos a também sempre ótima Fabíula Nascimento no papel de Silvia, que de desconfiada, “evolui” para uma mulher feliz com a nova etapa da vida.

     Este aspecto é um ponto interessante, principalmente pela ousadia da protagonista Rosa em que o espectador, ciente do que ocorre , sente o clima de constrangimento para a personagem Silvia, que não tem a menor ideia do envolvimento do seu marido com a sua nova amiga (que acredito deveria ser mais contundente devido a reação dele anteriormente) e confidente. Quanto aos personagens podemos fazer uma ressalva talvez a personagem Bete (Thalita Carauta) que me soa como um “realismo caricato” do subúrbio, servindo sempre de estudo antropológico para a Zona sul. Sempre ao som de funk ou pagode ao fundo, mas que no fim tem uma participação que se torna funcional e não somente com válvula para alívio cômico.

     E a impulsão necessária para tais acontecimentos vem de Leandra Leal, que demonstra realmente ser uma atriz extraordinária, sem pudores  e com entrega total. Uma personagem que todo o momento dar a entender de ser envolvida e manipulada pelos acontecimentos, para apenas se mostrar algo totalmente diferente e levar adiante seu plano de vingança, mas que ao mesmo tempo se mostra irresponsável a ponto de transar sem camisinha e em aceitar ser a amante e sofrer humilhações de Bernardo. Não temos com deixar de reparar na expressão um pouco louca e contemplativa na cena que se encontra dentro do carro de Bernardo a beira da praia, deitando na cama da esposa em um jogo de cinismo ou quando revela a necessidade de comprar uma arma para se defender (ou atacar). A Atriz ainda nos entrega fortes cenas, como, depois de ser enganada por Bernardo, retorna para casa demonstrando toda a sua dor(Detalhe é a aparição do veterano Emiliano Queiroz em uma pequena participação com debilitado e frágil pai da protagonista).

     No ato final, a direção continua mostrando habilidade em retratar o clima e as motivações da protagonista, tanto no enquadramento e belo travelling no pátio da igreja e em sua escadaria quando a personagem de Leandra Leal decide qual decisão a ser tomada, quanto na fotografia que realça a personalidade da protagonista, e fazendo o espectador pensar o que será do futuro de todos os personagens e como encarar eternamente aquela verdade.  Enfim, “O Lobo Atrás da Porta” se revela eficiente suspense  em contar uma história que confirma a boa direção do estreante Fernando Coimbra e mostrando que não falta qualidade no cenário atual do cinema brasileiro.

Cotação 4/5