Miss Julie

Direção: Liv Ullman

Elenco: Jessica Chastain, Collin Farrell, Samantha Morton e Nora Mcnemany.

Baseado na famosa peça de August Strindberg, ”Miss Julie” se transforma no geral em uma boa adaptação cinematográfica, com destaque para o reduzido elenco e o roteiro que trata do relacionamento entre classes sociais incompatíveis, onde tais envolvidos expurgam suas paixões, medos, traumas, crenças e fragilidades psicológicas. Um longa que pouco foge de sua inspiração teatral, mas que em sua narrativa cinematográfica rende bons momentos, mesmo padecendo de menos formalidade ou exageros em sua abordagem.

A diretora Liv Ullman imediatamente usa planos abertos e expõe a bela fotografia, ao apresentar a pequena Julie (Mcnemany), sendo subjugada em usa mansão cercada de luxo, mas que encontra apenas nas cercanias da floresta  vista da sua janela a fuga para sua solidão e ausência da mãe. Um exemplo da boa condução da direçao é quando num destes retornos para a casa, num belo raccord de movimento conhecemos a então adulta Julie, interpretada por Jessica Chastain: Uma mulher que aparentemente fria e sem qualquer apreço por contatos com seus subalternos, mas que nutre certa atração pelo empregado John (Farrell), já comprometido com a serviçal Kathleen (Morton).

O foco do roteiro (ou peça) é mesmo é o embate entre Julie e John em que através de seus longos diálogos, vamos sendo levados pelas transformações de caráter de ambos envolvidos. Tanto John quanto Julie se alternam em suas fantasias, visões e desejos pelo outro, sem esquecerem jamais que tal envolvimento jamais será aceito pela sociedade. Mas que durante sua construção e resolução ficamos a pensar quem realmente era o mais problemático dos indivíduos.

As atuações de Farrell e Chastain se completam. Se no primeiro, temos um homem dedicado ao trabalho, que passou a vida todo oprimindo seus sentimentos de maneira fabulesca com relação à Julie, intensificado por um Collin Farrell dinâmico, na segunda temos o destaque por ser uma mulher que aos pouco vai sendo desconstruída de valores, sentimentos e imagem, interpretada com vitalidade pela atriz que a cada dia solidifica sua carreira.

O design de produção é suficientemente atraente em sua reconstrução de época para atender o roteiro. Ciente que praticamente toda a ação do filme de passa dentro de uma cozinha, a direção sabiamente expande os diálogos para outros cômodos a fim de agilizar a narrativa para o público (evitando, por exemplo, a câmera parada durante muito tempo) - novamente, a abordagem teatral, jamais deixa o espectador fugir deste ambiente, com posicionamento de certa maneira rígido (questão mais de escolha da direção que propriamente um erro).

Todavia também, destacamos a decisão da direção com relação a ratificar o isolamento dos personagens, ao sugerir, por exemplo, a presença do Barão (que nunca vemos) apenas com o toque de uma campainha e o barulho vindo do lado de fora da mansão de pessoas comemorando o solstício do inverno. Assim, em seu âmago, “Miss Julie” contém um tom (trágico) e sexista, um reflexo de uma época, mas que em seu contexto tem uma história atemporal, o suficiente para tornar o pano de fundo ao clima doentio que se instalou entre hierarquias desiguais. Uma verdadeira tragédia grega de sentimentos explorada em sua mais alta psicopatia.

Cotação 3/5